“Não é segurando nas asas que se ajuda um pássaro a voar. O pássaro voa simplesmente porque o deixam ser pássaro […]”
Antes de nascer o mundo, p. 52, de Mia Couto. São Paulo: Companhia das Letras, 2009

“Não é segurando nas asas que se ajuda um pássaro a voar. O pássaro voa simplesmente porque o deixam ser pássaro […]”
Antes de nascer o mundo, p. 52, de Mia Couto. São Paulo: Companhia das Letras, 2009
Ao meu amigo André Marques
Voa, pássaro, voa largo
Voa sem medo de voar
Voa sem pressa de chegar
Onde o pouso te espera e te recompensa
Voa, pássaro, toma o céu
Fisga-te da inércia das paragens
Emula-te pela generosa viagem
Que te compraz e te compadece
Voa, pássaro, voa largo
Voa sem medo de voar
Mergulha grande até fugidio, alcançar
Asa amiga, galho farto, azul de mar.
“Voa para além deste tempo, deste agora.
Eu lhe dou minhas asas.
Você faz de mim sua casa.
E assim seremos, sem hora.”
Viva
Corra o mesmo risco de quem, descalço e infantil, inquieto e febril, ama.
Faça o mesmo riso de quem, entregue e servil, completo e gentil, ama.
Viva a lida fácil de quem, disposto a amar, incerto e feliz, ama.
Como alguém despido de temor e com ardor, ama.
Como além do viço do calor e com fervor, ama.
Com a vida toda em vigor, ama.
Apenas por ser vida
E pelo amor, ama.
Singela ternura
Em mim refugia
A doce brandura
Perene alegria
Singela ternura
Em mim alivia
Incerta ventura
Serena avaria
Singela ternura
Em mim se aninha
A fonte de cura
Solene folia.
O vento
É lamento
Que intenta
Despir
Perfume
Que lento
Insiste
Pedir
A calma
Na alma
Unguento
A remir
O vento
É o tempo
De ser
A brandir
Acento
Urgente
Concerto
A falir
Alento
O jeito
Da vida
Seguir.
Imagem: http://themountainlaurel.tumblr.com/post/41886017327/away-with-the-fairies-by-amanda-cass
Este vômito que escapa dos buracos
E alcança destinos incalculados
Inunda de vazio os becos
Da dignidade insultada.
Este vapor que deixa os poros
E intoxica a fé sem dolo
Arrebata de horror os crentes
Da realidade empenhada.
Este calor que escancara os fatos
E denuncia passados minados
Equilibra de poder os gritos
Da intensidade negada.
Nota sobre a imagem: Digital Vomit” é um projeto continuo de Alberto Seveso, desenvolvido a partir de fotografias atraentes, uma impressora de jato de tinta e técnicas de intervenção que resultam em composições excepcionais. Ler mais em: http://www.zupi.com.br
Link da imagem: http://pin.it/mh7qVVf
Um dia, serei amiga do meu tempo
Só farei coisas que o agradam
Cuidarei de sua vida com zelo
Como quem carrega o último copo d´água.
Um dia, viverei o tempo com a economia do cuidado
Com a delicadeza, a gentileza do compromisso
Exercitando o uso consciente do valor
Do que se estima tanto por ser inestimável.
Meu tempo, hoje, não se flete às minhas vontades
Não se dobra ou se contamina
Não me pertence.
E, em seu rigor, manejado pelo vazio
Arrasta-me.
De 20 de agosto de 2014 (postado originalmente em Dezembro de 2015)
Fonte da imagem em Pinterest: https://br.pinterest.com/pin/483222234997411415/visual-search/?x=94&y=129&w=376&h=517