Vi andando pelo quintal a avareza, enrijecida em si mesma, controlada no medo e tecida com zelo. Nos fundos, a delicadeza varria acantoando o lixo. E todos os homens banhavam-se no verniz.
Mês: março 2017
Inevitável
Conspicuamente às escuras
Insidiosamente certo
Permanentemente febril
Auspiciosamente às turras
Inevitavelmente reto
Inconsolavelmente frio
Acintosamente às juras
Distraidamente perto
Irrestritamente vil
O amor
A dor
A flor
Microconto Um
A coisa se mostrava séria com a sucessão de treinos dialógicos entre a terapeuta e o menino azul clarinho. De repente, entre um olhar doce e uma mechinha de cabelo ruivo ajeitada de lado, a delicadeza se pôs na conversa, dizendo: “Estou muito feliz porque hoje eu vou na casa da minha vovó! Lá, eu tenho abraços, televisão, biscoitos fresquinhos e um suéter… com amor em cada ponto!”
Menininho
Uma constelação de amores
Faz uma nuvem de paz
Um dissabor de outono
Refaz o barulho no ar
Um menininho cantante
Faz um momento que apraz
Uma história vibrante
Mareja de luz o olhar
Uma nuvem de outono
Faz o barulho do ar
Um menininho vibrante
Refaz a história de paz.
Game
I am a sad creation
You are a deep sensation
I am the flesh on fire
You are the best desire
I am a lap increased
You are a beat in peace
I am the faster bomb
You are the next song
I am a pretty liar
You are the top higher
I am the lost in mind
You are the voice alive.
Vento no Litoral, de Renato Russo
Procure não cantar. Leia. Sim, será uma experiência difícil, considerando que aquela voz completa, forte e densa contorna de sentidos a letra, qualquer letra. Mas, daí… percebendo que irá falhar ao negar a melodia, num ímpeto irrefreável, a canção melancólica simplesmente se articulará em seus lábios e as notas brotarão fáceis, colocando-te num tempo em que o mundo era mais bonito porque havia entre nós aquele Renato. Um deleite… sentirá seu espírito, e a paz do vento soprando no litoral.
De tarde quero descansar, chegar até a praia e ver
Se o vento ainda está forte
E vai ser bom subir nas pedras
Sei que faço isso para esquecer
Eu deixo a onda me acertar
E o vento vai levando tudo embora
Agora está tão longe
Vê, a linha do horizonte me distrai:
Dos nossos planos é que tenho mais saudade,
Quando olhávamos juntos na mesma direção
Aonde está você agora
Além de aqui dentro de mim?
Agimos certo sem querer
Foi só o tempo que errou
Vai ser difícil sem você
Porque você está comigo o tempo todo
Quando vejo o mar
Existe algo que diz:
– A vida continua e se entregar é uma bobagem
Já que você não está aqui,
O que posso fazer é cuidar de mim
Quero ser feliz ao menos
Lembra que o plano era ficarmos bem?
– Ei, olha só o que eu achei: cavalos-marinhos
Sei que faço isso para esquecer
Eu deixo a onda me acertar
E o vento vai levando tudo embora
Metal contra as nuvens, de Renato Russo
Renato Russo, em toda sua intensidade e verdade, fez, faz e sempre fará parte da minha agudeza e inquietação. Fui moldada por sua música e por sua poesia enquanto tentava fazer crescer a menina paulistana impetuosa e assustada. Inaugurei hoje, talvez pela chegada do Outono, uma temporada de Renato por aqui… arrancando as próprias folhas, enxergamos melhor nossas raízes. Para hoje, Metal Contra as Nuvens.
Não sou escravo de ninguém
Ninguém, senhor do meu domínio
Sei o que devo defender
E, por valor eu tenho
E temo o que agora se desfaz.
Viajamos sete léguas
Por entre abismos e florestas
Por Deus nunca me vi tão só
É a própria fé o que destrói
Estes são dias desleais.
Eu sou metal, raio, relâmpago e trovão
Eu sou metal, eu sou o ouro em seu brasão
Eu sou metal, me sabe o sopro do dragão.
Reconheço meu pesar
Quando tudo é traição,
O que venho encontrar
É a virtude em outras mãos.
Minha terra é a terra que é minha
E sempre será
Minha terra tem a lua, tem estrelas
E sempre terá.
II
Quase acreditei na sua promessa
E o que vejo é fome e destruição
Perdi a minha sela e a minha espada
Perdi o meu castelo e minha princesa.
Quase acreditei, quase acreditei
E, por honra, se existir verdade
Existem os tolos e existe o ladrão
E há quem se alimente do que é roubo
Mas vou guardar o meu tesouro
Caso você esteja mentindo.
Olha o sopro do dragão…
III
É a verdade o que assombra
O descaso que condena,
A estupidez, o que destrói
Eu vejo tudo que se foi
E o que não existe mais
Tenho os sentidos já dormentes,
O corpo quer, a alma entende.
Esta é a terra-de-ninguém
Sei que devo resistir
Eu quero a espada em minhas mãos.
Eu sou metal, raio, relâmpago e trovão
Eu sou metal, eu sou o ouro em seu brasão
Eu sou metal, me sabe o sopro do dragão.
Não me entrego sem lutar
Tenho, ainda, coração
Não aprendi a me render
Que caia o inimigo então.
IV
– Tudo passa, tudo passará…
E nossa estória não estará pelo avesso
Assim, sem final feliz.
Teremos coisas bonitas pra contar.
E até lá, vamos viver
Temos muito ainda por fazer
Não olhe pra trás
Apenas começamos.
O mundo começa agora
Apenas começamos.
Desnublar
Eu fui paz
Em névoa
Me fiz cais
Completa
Senti fé
Em festa
Sem um mas
Que resta
Vi a luz
Confessa
Do amor
Que zela
Comunhão
Em meta
A vibrar
Honesta
Senti luz
Em festa
De uma paz
Confessa
E num cais
Sem névoa
Comunhão
Honesta.
Sopro
O vento
É lamento
Que intenta
Despir
Perfume
Que lento
Insiste
Pedir
A calma
Na alma
Unguento
A remir
O vento
É o tempo
De ser
A brandir
Acento
Urgente
Concerto
A falir
Alento
O jeito
Da vida
Seguir.
Imagem: http://themountainlaurel.tumblr.com/post/41886017327/away-with-the-fairies-by-amanda-cass