Oco


Se pudesse, ela dobraria cada segmento do seu corpo para escondê-los no buraco aberto em seu peito.
Naquele oco sem fundo, interminável, que se fizera marca nova da vida que escolheu seguir.
Os pés tortos, os joelhos apertados, as pernas contra o vazio contorciam o desejo de menos dor.
Para domar sua alma chorosa
Sequiosa de paz
E calor.

Sozinha

Viver sozinha
É algo que não se resolve.
Porque é sozinha que caminha uma mulher na saga de ser mulher na vida.
Numa fase ainda de alguma esperança por companhia e comunhão
Ela acredita que mãos dadas podem sanar a carência, dar presença e completude… parceria no caminho…
Mas não.
Um alguém perto é tão somente alguém perto
Que perdido em meio a carências próprias, perde-se sozinho também.
É preciso espalhar lá dentro um tanto de sementes novas
Para ver brotar o belo no cenário da solidão.
E ser feliz assim, encoberta e protegida por este pequeno mundo secreto de si mesma.
Com cores e luz
Com flores e cada camada de si mesma
Da menina, da jovem criando sina, da mulher arrependida e quebrada.
Estar só é condição de ser gente.
Sozinha desde, profundamente e para sempre
É o lugar de ser mulher nessa vida.

Tarde de amor perfeito

“Naquela tarde eu fechei os olhos e sonhei que vivia uma história muito bonita… uma história de amor, com todos os desatinos e as tempestades de uma história de amor. Por alguns instantes eu esqueci a obrigação da sensatez e do equilíbrio e me entreguei a um mundo de sensações e êxtase que rompeu a ordem do tempo e da minha realidade cinza… Imaginei um homem e uma vontade. Coloquei entre eles a minha presença sequiosa de carinho e pintei um cenário de cores fortes para me deitar. Estiquei o meu corpo no dele, aquietei minha ansiedade e vivi as iniciativas do calor. Senti a severidade do correr do tempo pulsando nos meus braços e depois a tristeza que me leva a sonhar minha imaginação fértil, fruto de mais um dia sem ninguém…”

14 de abril de 2002